Profissionais da Cultura são independentes por causa do trabalho que fazem
Oito em cada dez profissionais da Cultura dizem ser independentes por causa da natureza e duração do trabalho e, para a maioria, a independência é uma forma de estar, apesar das desvantagens, revela um inquérito ao setor.
Os dados são divulgados hoje pelo Observatório Português das Atividades Culturais (OPAC), a partir de um inquérito aos profissionais independentes da Cultura, o primeiro do género a ser feito em Portugal, encomendado em 2020 pela tutela da Cultura, e que contou com uma amostra de 1.727 profissionais independentes.
Segundo o relatório hoje divulgado, 79% dos inquiridos concordam que ser trabalhador independente está diretamente relacionado com a natureza e a duração do projeto cultural em que estão envolvidos, e 70% afirmam que ser independente é uma forma de estar na vida ou na profissão.
Por outro lado, metade dos profissionais inquiridos (49%) considera que essa independência laboral é “uma forma de gerir a atividade, mantendo a autonomia relativamente a patrões e chefes”, mas 41% diz-se independente por culpa da entidade empregadora, e que isso é “um travão para uma desejada (e esperada) situação contratual permanente”.
Seis em cada dez (61%) consideram que se trata de “uma mera forma de retribuição” pelos serviços no setor artístico e cultural, analisa o OPAC.
Segundo o observatório, a idade e a duração da carreira mostram “clivagens de geração” no entendimento do trabalho independente. Por exemplo, 80% dos profissionais das artes com mais de 55 anos consideram que ser trabalhador independente é “uma forma de estar na vida”. A geração mais nova é “menos permeável neste indicador”.
O inquérito da OPAC permite ainda concluir que “as desvantagens são substancialmente mais numerosas do que as vantagens” em ser-se trabalhador independente na área da Cultura.
Desproteção social, instabilidade financeira, incapacidade de acesso a empréstimos bancários, ‘stress’ e insegurança em relação ao futuro, impossibilidade de formar uma família e desequilíbrio entre contribuições fiscais e direitos sociais são algumas das desvantagens apontadas pelos inquiridos.
Entre as vantagens da condição de trabalhador independente citadas no inquérito estão uma maior autonomia na gestão de tempo, liberdade de criação e de participação em diferentes projetos e com diferentes entidades, e “possibilidade de uma remuneração relativamente mais elevada”.
Os três relatórios anteriores divulgados pela OPAC indicavam que o rendimento mensal líquido de metade dos trabalhadores independentes da Cultura fica abaixo dos 600 euros, e perto de 20% ganham menos de 150 euros, e que perto de quatro em cada 10 trabalhadores independentes da Cultura são prestadores de serviços sem qualquer contrato.
Concluiu-se ainda que a maioria dos trabalhadores independentes da Cultura está inscrita nas Finanças e na Segurança Social, mas há “desfasamentos” nestes sistemas que evidenciam “situações de desproteção social”.
Verifica-se ainda “um desajuste dos códigos CIRS [Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares] face à realidade do setor cultural e artístico – uma vez que não permitem saber com o detalhe que seria desejável qual a área em causa”.
Há um ano, em junho de 2020, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, anunciou a intenção de promover um inquérito a todos os profissionais do setor e um mapeamento do tecido cultural, que serviriam de análise, atualização e adaptação dos regimes dos contratos laborais destes trabalhadores.
Quanto ao emprego no setor cultural português, segundo os números divulgados em junho de 2020 pelo Ministério da Cultura, os 160.600 trabalhadores existentes em 2018 representavam então 3,3% do emprego total, o que colocava o país em quarto lugar, com o menor peso de emprego cultural, na União Europeia.
Segundo os dados, em Portugal, uma em cada quatro pessoas trabalha em atividades culturais por conta própria, de forma independente, uma proporção “significativamente superior à que se verifica para o total do emprego”.
Os dados do OPAC são divulgados numa altura em que o Estatuto dos Profissionais da Cultura está em consulta pública, a decorrer até ao próximo dia 17.
A 02 de junho, no Parlamento, a ministra da Cultura disse que já tinham sido submetidos “vários contributos”, e reforçou a disponibilidade do Governo para fazer alterações ao documento.
Fonte: Lusa